Em menos de seis meses, um Boeing 707 da Varig foi sequestrado três vezes e, em todas elas, foi parar em Cuba. Estamos falando do quadrimotor de matrícula PP-VJX, que acabou ganhando o apelido de “Expresso Cubano”.
Entre 1969 e 1972, ao menos 15 aeronaves sofreram sequestros no Brasil. O período era de ditadura militar. Muitos grupos eram avessos ao então governo e militantes e fugitivos políticos buscavam sair do País. Cuba era o local mais procurado, uma vez que oferecia auxílio a movimentos dispostos a lutar contra regimes aliados aos Estados Unidos. Na época, o Brasil não contava com voos diretos para o país insular no Caribe e, uma das formas de chegar até o local, era sequestrar aeronaves e direcioná-las para a ilha então comandada por Fidel Castro. A segurança nos aeroportos também não era a mesma de hoje, o que facilitava tais ocorrências.
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Primeiro Sequestro
Era uma terça-feira, 4 de novembro de 1969, quando o PP-VJX cumpria o voo RG863 entre Buenos Aires e Santiago, com origem no Rio de Janeiro. A bordo, 101 ocupantes, incluindo 89 passageiros e 12 tripulantes.
Tudo transcorria normalmente até que a tripulação foi surpreendida por dez sequestradores do grupo terrorista brasileiro “Frente de Libertação Nacional”, sendo nove homens e uma mulher, após 30 minutos da partida de Ezeiza, quando o jato já estava em voo de cruzeiro. Armados com pistolas, eles exigiram que o voo fosse alternado para Havana.
Como a aeronave não tinha combustível suficiente para voar até Cuba, seguiu para Santiago, onde foi reabastecida. O grupo permitiu que uma grávida e seu marido desembarcassem no Chile.
Após o reabastecimento, o quadrimotor da Varig decolou da capital chilena às 17h33 (local) e voou rumo ao Aeroporto José Martí, onde pousou às 1h28 da manhã (horário Brasília) do dia 5.
O jato ficou retido em Havana por 15 horas. Todos os ocupantes foram obrigados a desembarcar e passaram por um interrogatório pelas autoridades locais.
Com os sequestradores em Cuba, no final da tarde do dia 5, o PP-VJX decolou para Nassau, nas Bahamas, e depois fez mais uma parada em Caracas, na Venezuela, onde quatro passageiros, que exigiam seguir até Santiago e ameaçavam sequestrar a aeronave novamente, foram desembarcados. A odisseia do jato terminou às 18h26 do dia 6, quando finalmente chegou ao Rio de Janeiro e foi cercado pela polícia. Os ocupantes passaram por um novo interrogatório, agora pelas autoridades brasileiras.
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Segundo Sequestro
Três semanas após o ocorrido, o PP-VJX decolou em 28 de novembro de 1969 de Paris no voo RG827 para o Rio de Janeiro. Comandado por Délio Lima, o Boeing estava com 81 passageiros a bordo e quando sobrevoava o sul de Portugal, um passageiro de nacionalidade argelina, com uma pistola e uma faca, invadiu a cabine. A exigência? Voar até Cuba.
A aeronave mudou seu curso e voou rumo ao Caribe. Antes de pousar em Havana, foi necessária uma parada para reabastecimento em Porto Rico e também para pegar o “kit Cuba”, que continha dados para pousar em Cuba. Os passageiros desembarcaram na capital cubana e, após o interrogatório, foram levados ao Hotel Riviera, que já era um ponto conhecido por receber hóspedes de voos sequestrados.
O ‘VJX’ foi liberado para voltar ao Brasil, mas antes, parou em Caracas para reabastecimento de combustível e de alimentos, que haviam esgotado. O jato finalmente pousou no Rio de Janeiro em 30 de novembro às 13h52.
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Terceiro Sequestro
Meses depois, em 12 de março de 1970, aconteceu o terceiro e último sequestro do “Expresso Cubano”. O 707 cumpria o RG862 de Santiago para Nova York, com paradas em Buenos Aires e no Rio de Janeiro.
Minutos após decolar da capital chilena, enquanto sobrevoava a vertical de Mendoza, na Argentina, o comandante Floriano Bortolo Scalabrim, então piloto chefe da Varig, foi surpreendido ao ser informado que um homem estava fazendo uma das comissárias de refém, ordenando que a aeronave fosse desviada para Cuba. O combustível não era suficiente e o comandante decidiu regressar para Santiago.
Com 28 passageiros e 13 tripulantes, o ‘VJX’ decolou novamente da capital chilena, mas agora para Havana, às 20h30 e pousou na capital cubana às 4h30 (horário Brasília) do dia 13 de março. Os ocupantes foram novamente acomodados no Hotel Riviera e o quadrimotor desta vez permaneceu mais tempo em solo.
O jato só decolou do Aeroporto José Martí às 19h30 (hora de Brasília) do dia 15 e fez a mesma rota de regresso ao Brasil com uma parada em Caracas, na Venezuela. A aeronave chegou ao Rio de Janeiro às 5h55 do dia 16 e na mesma noite decolou no RG800 para Miami, com escala em Belém.
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Trajetória do PP-VJX
Entregue à Varig em 1968, o PP-VJX, ou melhor Expresso Cubano, deixou a companhia em 1986 e foi voar na Força Aérea Brasileira como FAB 2402.
A aeronave ficou em atividade até 2013, ano em que foi aposentada.
Uma curiosidade sobre esse período na aviação brasileira é, que mesmo a Varig não voando regularmente para Cuba, a companhia tinha as cartas de procedimento do Aeroporto José Martí, em Havana, por conta da alta incidência de sequestros.
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